A inclusão
rompe com os paradigmas que sustentam o conservadorismo das escolas,
contestando os sistemas educacionais em seus fundamentos. Ela questiona a
fixação de modelos ideais, a normalização de perfis específicos de alunos e a
seleção dos eleitos para frequentar as escolas, produzindo, com isso,
identidades e diferenças, inserção e/ou exclusão.
O
poder institucional que preside a produção das identidades e das diferenças
define como normais e especiais não apenas os alunos, como também as suas
escolas. Os alunos das escolas comuns são normais e positivamente valorados. Os
alunos das escolas especiais são os negativamente concebidos e diferenciados.
Os
sistemas educacionais constituídos a partir da oposição - alunos normais e
alunos especiais - sentem-se abalados com a proposta inclusiva de educação,
pois não só criaram espaços educacionais distintos para seus alunos, a partir
de uma identidade específica, como também esses espaços estão organizados
pedagogicamente para manter tal separação, definindo as atribuições de seus
professores, currículos, programas, avaliações e promoções dos que fazem parte
de cada um desses espaços.
Os
que têm o poder de dividir são os que classificam, formam conjuntos, escolhem
os atributos que definem os alunos e demarcam os espaços, decidem quem fica e
quem sai destes, quem é incluído ou excluído dos agrupamentos escolares.
Ambientes
escolares inclusivos são fundamentados em uma concepção de identidade e
diferenças, em que as relações entre ambas não se ordenam em torno de oposições
binárias (normal/especial, branco/negro, masculino/feminino, pobre/rico). Neles
não se elege uma identidade como norma privilegiada em relação às demais.
Em
ambientes escolares excludentes, a identidade normal é tida sempre como
natural, generalizada e positiva em relação às demais, e sua definição provém
do processo pelo qual o poder se manifesta na escola, elegendo uma identidade
específica através da qual as outras identidades são avaliadas e
hierarquizadas.
Esse
poder que define a identidade normal, detido por professores e gestores mais
próximos ou mais distantes das escolas, perde a sua força diante dos princípios
educacionais inclusivos, nos quais a identidade não é entendida como
natural, estável, permanente, acabada, homogênea, generalizada, universal.
Na perspectiva da inclusão escolar,
as identidades são transitórias, instáveis, inacabadas e, portanto, os alunos
não são categorizáveis, não podem ser reunidos e fixados em categorias, grupos,
conjuntos, que se definem por certas características arbitrariamente
escolhidas.
É
incorreto, portanto, atribuir a certos alunos identidades que os mantêm nos
grupos de excluídos, ou seja, nos grupos dos alunos especiais, com necessidades
educacionais especiais, portadores de deficiências, com problemas de
aprendizagem e outros tais. É incabível fixar no outro uma identidade normal,
que não só justifica a exclusão dos demais, como igualmente determina alguns
privilegiados.
A
educação inclusiva questiona a artificialidade das identidades normais e
entende as diferenças como resultantes da multiplicidade, e não da diversidade,
como comumente se proclama. Trata-se de uma educação que garante o direito à
diferença e não à diversidade, pois assegurar o direito à diversidade é
continuar na mesma, ou seja, é seguir reafirmando
o
idêntico.
A
diferença (vem) do múltiplo e não do diverso. Tal como ocorre na aritmética, o
múltiplo é sempre um processo, uma operação, uma ação. A diversidade é
estática, é um estado, é estéril. A multiplicidade é ativa, é fluxo, é
produtiva. A
multiplicidade
é uma máquina de produzir diferenças - diferenças que são irredutíveis à
identidade. A diversidade limita-se ao existente. A multiplicidade estende e
multiplica, prolifera, dissemina. A diversidade é um dado - da natureza
ou
da cultura. A multiplicidade é um movimento. A diversidade reafirma o idêntico.
A multiplicidade estimula a diferença que se recusa a se fundir como idêntico
(SILVA, 2000, p.100-101).
De
fato, a diversidade na escola comporta a criação de grupos de idênticos, formados
por alunos que têm uma mesma característica, selecionada para reuni-los e
separá-los. Ao nos referirmos a uma escola inclusiva como aberta à diversidade,
ratificamos o que queremos extinguir com a inclusão escolar, ou seja, eliminamos
a possibilidade de agrupar alunos e de identificá-los por uma de suas
características (por exemplo, a deficiência), valorizando alguns em detrimento
de outros e mantendo escolas comuns e especiais.
Atenção,
pois ao denominarmos as propostas, programas e iniciativas de toda ordem direcionadas
à inclusão, insistimos nesse aspecto, dado que somos nós mesmos quem atribuímos
significado, pela escolha das palavras que utilizamos para expressá-lo. É por meio
da representação que a diferença e a identidade passam a existir e temos, dessa
forma, ao representar o poder de definir identidades, currículos e práticas
escolares.
Fonte:A Educação Especial na Perspectiva da Inclusão Escolar - A Escola Comum Inclusiva
Colegas Professores,
Espero que esse texto tenha oportunizado uma boa reflexão para esclarecer o tema. Gostaria ainda de comentar que o texto é datado de 2010 e nesta época a pessoa com deficiência era nomeada de portadores de deficiência. A nomenclatura evolui com as nossas concepções pois, percebo que hoje já nos enxergamos todos como pessoas. Muito temos a caminhar e transformar nos espaços em que convivemos para não mais precisar deste como reflexões que classificam as pessoas. Se tiver sugestão de tema estou aberta a receber.